Luciana Valente
Muito tem se falado nas estatísticas de aumento de acidente do trabalho nos últimos 5 (cinco) anos, onde Minas Gerais aparece na vice-liderança no ranking, ficando atrás apenas do estado de São Paulo.
Não que se queira aqui eximir de responsabilidades os empregadores que não atendem fundamentalmente a toda legislação atinente à saúde e segurança do trabalho, mas fato é que, com o advento e a efetiva aplicação ao longo dos anos do Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário (NTEP) e o FAP (Fator acidentário Previdenciário), que vigoram desde abril de 2007, instituído pelo Decreto nº. 6042/2007, regulamentador do artigo 14 da Lei nº. 10666/03, notou-se o aumento significativo do número de constatações de acidentes de trabalho e ajuizamento de reclamatórias trabalhistas, ações cíveis e criminais, envolvendo atividades ocupacionais.
Para fins de uma melhor compreensão, cumpre-nos conceituar o acidente de trabalho propriamente dito e suas equiparações nos termos da Lei 8.213 de 24 de julho de 1991, que dispõe em seu artigo 19 que: "Acidente do trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa ou pelo exercício do trabalho dos segurados referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho". E em seu Artigo 20: "Consideram-se acidente do trabalho: I - doença profissional, assim entendida a produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade e constante da respectiva relação elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social; II - doença do trabalho, assim entendida a adquirida ou desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente, constante da relação mencionada no inciso I."
Ocorre que, com o passar dos anos de efetiva aplicação dos novos métodos Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário (NTEP) e o FAP (Fator acidentário Previdenciário) aplicáveis desde abril de 2007, os quais integram a relação elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social mencionadas no inciso I do artigo 20 da Lei, acima transcrito, que consistem em auxiliar os peritos para que estes possam determinar a correlação entre o acidente e a atividade exercida pelo empregado e seu enquadramento, conforme o código da doença (CID), para fins de se considerar a ocorrência do acidente de trabalho e assim autorizar o recebimento do benefício junto à Previdência Social, passou-se a ter o nexo de causalidade entre o acidente/doença e o trabalho exercido, muito mais facilmente caracterizado, por meio de uma metodologia de tabelamento onde as doenças e acidentes encontram-se relacionadas com a prática correspondente a uma atividade profissional, pois, os laudos periciais raramente são conclusivos ou demonstram com exatidão o nexo causal, o que tornava bastante insubsistente a efetiva constatação da ocorrência do acidente para fins de recebimento do auxílio respectivo junto à Previdência Social.
A verificação pericial da ocorrência de acidente de trabalho, após as tabelas do Nexo Epidemiológico e do Fator Acidentário Previdenciário, aplicáveis quando houver significância estatística da associação entre o código da Classificação Internacional de Doenças - CID - e o da Classificação Nacional de Atividade Econômica - CNAE (doenças infecciosas e parasitárias relacionadas com o trabalho),acabou por caracterizar automaticamente e com muito maior facilidade que se trata de benefício acidentário e não de benefício previdenciário normal, caso a patologia identificada encontre enquadramento descrito na tabela, atraindo inclusive o ônus probatório para o empregador, a quem caberá provar que a suposta ocorrência patológica não foi causada pela atividade desenvolvida pelo trabalhador. Anteriormente à vigência do NTEP, o INSS ou o obreiro é que deveriam comprovar o nexo de causalidade entre os danos e a atividade laborativa.
Entretanto, as avaliações não levam mais em consideração as múltiplas causas como idade, fatores genéticos, sexo, raça, predisposições e demais fatores biológicos que possam influenciar um suposto diagnóstico do trabalhador, vindo então a serem considerados como acidente de trabalho devido ao enquadramento no nexo técnico epidemiológico um número muito maior de casos, o que veio nos últimos anos a fomentar as tristes estatísticas.
A utilização de forma indiscriminada da metologia merece de fato atenção, principalmente em virtude das inúmeras conseqüências que geram o acidente de trabalho, destacando-se a estabilidade concedida ao empregador pelo prazo mínimo de doze meses, contado da cessação do auxílio, a reparação patrimonial, moral, por lucros cessantes, estética etc, a possível ação de regressiva perante a Previdência Social, dentre outras.
Lado outro, o próprio decreto que regulamentou a aplicação dos institutos em questão abriu margem para contestação, no sentido de que, quando a decisão da perícia do INSS julgar a ocorrência de acidente ou doença que for equiparada a acidente de trabalho e esta decisão for fundamentada com base nos nexos e havendo inconformismo acerca da decisão, caberá recurso ao Conselho de Recursos da Previdência Social (CRPS).
Assim sendo, vale o alerta para que empregadores e empregados lancem mão dos institutos da ampla defesa e do contraditório, sempre que houver dúvida acerca da Perícia Médica pelo INSS realizada com base no NTEP e no FAP, para que a aplicação do Nexo Técnico Epidemiológico seja utilizado de forma benéfica e justa, mas não indiscriminada, dando origem a ações judiciais nos âmbitos trabalhista, previdenciário, cível, criminal e consequentemente vindo a fomentar as estatísticas.
* Luciana Carneiro Valente é Advogada Especialista em Direito Empresarial.
Fonte: Fiscosoft
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