terça-feira, 29 de junho de 2010

FAP - Representante dos empregadores fala sobre mudanças no FAP

O Conselho Nacional da Previdência Social aprovou, no último dia 31, um conjunto de mudanças no FAP, multiplicador que a partir de 2010 passou a incidir no cálculo do Seguro Acidente de Trabalho das empresas. O resultado foi saudado por governo, empregadores e centrais sindicais. O blog Relações do Trabalho da Confederação Nacional da Indústria (CNI) realizou uma entrevista com o representante da bancada de empregadores na negociação, Emerson Casali (foto), que fala sobre as negociações, as mudanças realizadas e os próximos passos, e ressalta que "poucos perceberão o valor desta negociação, que traz um auspicioso exercício do diálogo tripartite".

Blog RT - É possível comemorar as mudanças no FAP?
Casali - Sem dúvida. As mudanças vêm ao encontro do desejo de melhorias efetivas do FAP, ainda que o entendimento seja de que foi apenas um passo dentro de um processo que exigirá melhorias permanentes.

O resultado pode ser visto como uma vitória dos empresários?
Casali - O resultado pode ser visto como uma vitória das três partes: governo, empregadores e trabalhadores. Avançamos para um FAP que se aproxima mais dos seus objetivos de estimular a prevenção nas empresas, que é o que todos queriam. O novo FAP trabalha melhor a questão de bonificações e traz recados duros à negligência. Distencionamos também as relações entre os atores sociais e alinhamos objetivos.

Mas as coisas somente ocorreram porque os empresários pressionaram, não?
Casali - A mobilização empresarial foi fundamental, mas ela só produziria resultado se houvesse uma efetiva vontade do governo e das centrais de dialogar, o que de fato ocorreu. Sem dúvida o envolvimento do presidente da CNI, Deputado Armando Monteiro Neto, e de outras lideranças empresariais, que levaram o tema a vários fóruns e dialogaram com autoridades é uma sinalização clara de que algo estava errado no SAT. As confederações de empregadores trabalharam unidas. Contudo, pressionar por pressionar tende a não ter efetividade. Foi imprescindível trazermos fundamentos sólidos em nossas críticas, apontando quais os principais problemas e seus efeitos indesejados. O governo entendeu que deveríamos conversar para melhorar a metodologia para 2011 e convidou confederações e centrais para dialogar.

Então as propostas empresariais foram bem acatadas?
Casali - É importante esclarecer que nós não chegamos à mesa de negociação cheios de soluções prontas. Pelo contrário. Este processo agora foi muito bem conduzido pelo Dr. Remiggio (Diretor do Departamento de Saúde e Segurança Ocupacional do Ministério da Previdência Social) e primeiro alinhamos nosso objetivo comum: tornar o FAP mais efetivo como política de estímulo à prevenção, melhorando o instrumento e reduzindo suas distorções. Algumas premissas também foram alinhadas, como, por exemplo: afastar o FAP como instrumento para aumentar a arrecadação (algo que os empregadores reclamavam muito) e passar recados bastante duros a questões como subnotificação de acidentes e mortes no trabalho (pontos bem defendidos pelas Centrais).

Mas quanto aos anseios empresariais, o que foi discutido?
Casali - Foi um processo dinâmico e as propostas surgiram durante as discussões. A maioria das soluções veio dos próprios técnicos da Previdência, que apresentaram propostas muito interessantes. No geral, nós e as Centrais apresentávamos os problemas e todos discutiam a solução. Lógico que existem pontos de vista diferentes e muitas vezes tínhamos que ceder ou, se o tema exigisse uma discussão muito profunda, que envolvesse outros instrumentos além das modificações na resolução do FAP pelo CNPS, deixamos para um momento posterior. Enfim, chegamos ao melhor consenso possível.

Sobre as novidades, agora empresa sem acidentes receberá FAP igual a 0,5, mas não pode ser à custa de subnotificação, correto?
Casali - Exato. A proposta foi sinalizar para as empresas que elas devem perseguir zero de acidentes, pois vão ser bonificadas por isto. Essa era a idéia original do FAP, na nossa compreensão, mas acabou não ocorrendo na prática. Em geral, os descontos estavam muito pequenos para quem não tinha acidentes, como por exemplo, 5%, 7,2%, 0,8%, etc. O desconto agora será de 50%. Contudo, ficou decidido que a subnotificação para ficar com zero registros será fortemente punida, sendo estabelecido FAP igual a 2, nestes casos. Segundo a Previdência, são 350 mil empresas beneficiadas por esta medida que passará a valer já a partir de setembro de 2010.

Há também um problema de falta de enquadramento do CNAE que a Previdência anunciou que será punido?
Casali - Segundo o Ministério, cerca de 150 mil empresas não têm classificação de CNAE na Previdência, o que impede sua alocação em uma subclasse e o cálculo do seu FAP. Estas empresas estão recebendo FAP igual a 1, mas se não corrigirem no próximo ano, receberão FAP igual a 1,5 no ano seguinte, e 2 no ano posterior, se o problema persistir. É importante chamar atenção para o fato de que a maioria destas empresas já está sendo prejudicada, pois certamente teriam bonificações. É mais uma medida dura para quem não está correto.

E o que melhorou na metodologia?
Casali - Primeiro nós discutimos dois pontos controversos, que acusávamos de provocar majoração no FAP das empresas, que era a "regra de empates", e o que chamávamos "fórmula de majoração". Com as negociações, a primeira foi institucionalizada na nova resolução e a segunda eliminada. A segunda acabava fazendo com que entre as empresas bonificadas, seus descontos fossem reduzidos à metade. Ou seja, imagine uma empresa que tenha apenas uma CAT, que não gerou afastamento, e seu FAP calculado fosse de 0,88, que corresponde a um desconto de 12%; ao aplicar a fórmula que deixa de existir a partir de 2011, ela reduzia o desconto para 6%. O Ministério tinha uma explicação, mas nós não concordávamos.

Além destas, outras mudanças nos cálculos?
Casali - Sim. Houve outra mudança metodológica, que foi a mais relevante no sentido de tornar o FAP mais justo, além de amenizar o efeito deletério provocado pelo FAP 2010 no aumento dos custos do trabalho para o conjunto das empresas. Resumindo, o que percebemos é que talvez o percentil não seja a melhor solução metodológica para os objetivos, mas concordamos que não temos como fazer mudanças radicais em curto espaço de tempo. E, usando o percentil, já reclamávamos que, pelo fato de muitas empresas menores não terem acidentes, tinha sido criada uma grande distorção no cálculo do FAP das demais, e isto precisava ser pelo menos amenizado agora. O FAP de grandes empresas com excelentes trabalhos de prevenção ficava quase igual ao de outras muito negligentes. Isto era péssimo para o FAP, pois passava um recado às grandes empresas de que, fizessem o esforço que fosse, seu FAP baixaria muito pouco e ela continuaria muito punida só pelo fato de gerar muitos empregos. Ou seja, a metodologia não estimulava os investimentos em prevenção como pretendíamos.

E qual foi a solução?
Casali - Os especialistas da Previdência envolvidos com a discussão, Drs. Domingos Lino e Luiz Eduardo, desenvolveram uma solução que melhorou a situação. A explicação é muito técnica, mas, em síntese, agora, ao enfilerar as empresas no momento de calcular os percentis que compõem a fórmula do FAP, a primeira empresa que tem índice diferente de zero ficará no ponto médio do intervalo ocupado pelas empresas sem acidentes. Antes ocupava a posição no final deste intervalo. Por exemplo, imagine, que num setor existam 100 empresas, com 80 sem acidentes. Imagine que uma ótima empresa tenha uma CAT e está na posição 81. Com a nova fórmula, ela ficará agora logo após a metade do intervalo ocupado pelas 80 empresas, ou seja, na posição 41. A empresa que estava na posição 100, continua na 100. Com certeza, isto afastará os "melhores" dos "piores" e tornará o FAP mais justo e também reduz o impacto de custos do FAP para o conjunto das empresas. Ressalto que quem conseguir fazer os cálculos verá que a situação de fato melhorou.

E o fim do desconto de 25% no malus?
Casali - Esta foi outra discussão difícil, em que chegamos a uma solução boa, mas que acreditamos que precisará ser melhorada. Foi mantido o desconto de 25% nas empresas com FAP maior que um, no que passar de um (Malus). São sempre muita fórmulas... mas o fato é que as empresas que tiverem algum caso de morte ou invalidez permanente, não receberão o desconto, ou seja, o FAP poderá chegar a 2. A exceção é para o caso do registro derivar de um acidente de trajeto. É sem dúvida um recado muito duro que o novo FAP trás para estes casos de morte ou invalidez.

Então não há mais acidentes de trajeto no cálculo do FAP?
Casali - Neste momento, o acidente do trajeto ainda continua compondo o cálculo do FAP, mas não para o caso da pergunta anterior, nem para a chamada trava de mortalidade, que impede que a empresa nestes casos seja bonificada. É uma questão controversa, pois achamos que o FAP deve tratar dos riscos do ambiente de trabalho, em conformidade com o artigo da lei que o criou. Isto não significa negar a legislação que diz que o acidente de trajeto é acidente de trabalho. É apenas dizer que não entra neste cálculo. Mas as centrais não concordaram com esta mudança no momento e preferem amadurecer esta discussão.

E como foi o diálogo com as Centrais?
Casali - Eles são muito preparados para debater saúde e segurança do trabalho e são competentes em negociação. Dispuseram-se ao debate e aceitavam chegar a um acordo que melhorasse o FAP e ajudasse a preservá-lo enquanto instrumento, visto que o consideram muito útil. Eles impuseram algumas questões difíceis para nós, ligadas a punições, mas que têm uma lógica. Acharam que era importante manter as CATs sem afastamentos e desestimular a subnotificação. O principal negociador deles foi muito razoável em toda a discussão e muito hábil para conseguir pontos que almejavam. Por fim, queriam estar certos do nosso compromisso com a causa da saúde e segurança do trabalhador, mas isto não precisavam nem pedir.

E como ficam as ações judiciais?
Casali - Este foi um processo que desnecessariamente, na nossa visão, descambou para milhares de ações administrativas e judiciais. Nós sempre defendemos a criação deste instrumento do FAP e aprovamos no CNPS, mas assim que começou a implementação percebemos que havia muitos problemas, mas a Previdência naquele momento recusou-se a discutir. Como na prática ele parecia ser apenas elemento de arrecadação e ficou com muitos pontos controversos e de legalidade questionável, a área empresarial correu atrás para defender seus direitos. A judicialização foi ruim e trouxe novos custos para empresas e Estado. Não creio que as mudanças estimulem de imediato muitas empresas a retirarem suas ações, mas certamente diminuirá de forma expressiva o ingresso em novas ações no próximo ano.

Então os problemas jurídicos foram sanados?
Casali - Há outros problemas que ainda continuam, como o acesso das empresas aos cálculos do seu FAP, o processo de defesa administrativo, entre outros, que não foi viável resolver agora. Mas quanto aos pontos polêmicos, conforme disse o presidente da CNI, o próprio processo judicial ajudará a melhorar a metodologia do FAP, exigindo mudanças que tragam legalidade e segurança jurídica. Como isto é um processo longo, será possível ir aperfeiçoando o FAP a cada ano, e até fazer mudanças radicais se forem necessárias.

Quais os próximos passos previstos?
Casali - Foi firmado um compromisso de continuarmos a dialogar e isto decorreu justamente da capacidade que a Previdência teve de sair de uma situação de confrontação entre os atores e produzir um acordo histórico. Em minha opinião, o processo de diálogo foi mais importante que as melhorias no FAP. Ficou claro o fato de que podemos negociar em temas trabalhistas e conseguir soluções que sejam boas para o conjunto. Poucos perceberão o valor desta negociação, que traz um auspicioso exercício equilibrado do diálogo tripartite no país e a Previdência esteve atenta a isto. Esta negociação do FAP foi uma grande vitória de todos.

Mas e o RAT? Também não teve uma enxurrada de críticas?
Casali - Teve, pois, em nossa opinião, as mudanças vieram com um forte viés arrecadatório e com pouca transparência. Mas este ponto ficou de ser debatido até setembro, quando deverá ser editado um novo decreto com o reenquadramento dos setores para calcular o SAT a partir de 2011. Também ficamos de discutir o NTEP e a necessidade de aperfeiçoamentos técnico-científicos e operacionais. Empregadores e trabalhadores têm seus questionamentos, ainda que distintos, sobre o tema e precisaremos discuti-los com a Previdência.

É possível adiantar alguma coisa do que mudará no RAT?
Casali - Muito pouco. Trocamos algumas idéias iniciais, mas não aprofundamos. A única coisa que me parece que ficou claro é que precisaremos retirar alguns elementos que criaram distorções no enquadramento e que acabaram deixando aquela situação desequilibrada, em que quase não existe setor com risco leve (1%), enquanto mais da metade é risco grave (3%). Mas neste caso, o avanço que já ocorreu foi que chegamos à conclusão de que queremos que a metodologia seja justa e muito transparente, inclusive com os números de cada setor. O objetivo é que o setor possa observar os dados e se sentir estimulado a fazer um esforço conjunto para diminuir a acidentalidade e, por conseqüência, o seu RAT e o custo do Seguro Acidente de Trabalho das suas empresas no médio prazo. Mas ainda temos muito que conversar sobre isto.

A mudança no FAP é mais um estímulo para que Saúde e Segurança do Trabalho seja visto como um bom investimento pelas empresas?
Casali - Do ponto de vista econômico, sem dúvida investir em SST é um bom negócio. O FAP, se bem regulado, é um instrumento inteligente que tende a reforçar isto e ampliar os investimentos em prevenção. Logicamente precisaremos melhorar outros elementos do nosso marco-legal, que hoje estão muito descalibrados e trazem muita insegurança jurídica a quem gera empregos. De qualquer forma, é importante notar que acidente de trabalho era visto como algo comum, mas cada vez mais a sociedade fica intolerante a isto. Sem dúvida, muitas empresas estão avançando muito. O investimento em SST foi muito significativo nos últimos 10 anos no país. Mas outras ainda demonstram desconhecimento do tema e precisarão acordar e fazer rapidamente um choque de gestão em SST.

 
Fonte: Blog RT

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